Enurese Noturna é, a seguir à patologia alérgica, a disfunção física com maior incidência na infância. Esta situação não é uma doença, mas sim uma disfunção fisiológica que afeta a autoestima e socialização, devendo ser abordada e tratada.
A Enurese noturna é definida como a perda involuntária de urina, durante o sono, numa criança com 5 ou mais anos de idade.
A Enurese pode ser classificada em monossintomática, se não se verificam outros sinais e sintomas ou não monossintomática quando se associam outros sintomas, como a incontinência urinária diurna, urgência miccional, alterações do jato urinário, infeções urinárias, etc.
Pode ser primária, se a criança nunca adquiriu o controle de urina durante a noite, ou secundária, quando se verificou um período de, pelo menos, 6 meses de continência.
Em Portugal, a enurese noturna afeta cerca de 80.000 crianças entre os 5 e os 14 anos e estima-se que cerca de 55 milhões de crianças em todo o mundo sofram deste problema.
A prevalência de enurese primária varia com a idade, sendo mais frequente nos rapazes.
São várias as causas implicadas na etiologia da enurese noturna, desde fatores de ordem hereditária a fatores fisiopatológicos ou psicológicos. Crianças cujos pais ou irmãos sofreram de enurese noturna têm uma maior probabilidade (se um dos pais teve o problema o risco é aproximadamente de 40-45% e se ambos os pais tiveram enurese o risco sobe para 70-75%). A causa fisiopatológica mais frequente é a deficiência na produção noturna da hormona antidiurética, mas disfunções sono-vigília, e fatores urodinâmicos também têm a sua implicação. Fatores psicológicos também podem estar na génese da enurese noturna.
A enurese pode provocar efeitos negativos na vida da criança (sentimentos de vergonha e ansiedade, baixa autoestima, dificuldades de socialização, perda de qualidade de vida e rendimento escolar, etc.) e da sua família (perturbação do sono, ansiedade, frustração, stress familiar, etc.).
Perante uma situação de enurese noturna numa criança, os pais devem recorrer ao médico assistente da criança que avaliará, decidindo, se necessário, o envio a consulta especializada.
Deve ser feita avaliação clinica rigorosa, com análise de aspetos da vida diária da criança, nomeadamente: ingestão líquidos; os hábitos urinários; funcionamento intestinal durante o dia; as características e qualidade do sono; a existência de ressonar significativo; a frequência e características das perdas da urina durante a noite.
Deve também ser avaliado o impacto emocional da enurese na família e na criança e tentar identificar situações que possam ser responsáveis pela perturbação do equilíbrio emocional de psicológico da criança (divorcio dos pais, nascimento de irmão, dificuldades na adaptação à escola, etc.).
Na maior parte dos casos deve ser feita uma análise de urina, podendo ser necessário fazer ecografia renal com avaliação pós-miccional. Nas situações clinicas mais complexas pode haver necessidade de recorrer a outros exames de diagnóstico.
A terapêutica da enurese noturna exige uma boa relação entre o médico, a criança e a sua família, devendo a criança ser entendida e respeitada como um ser singular, com as suas limitações, medos e preferências.
O tratamento compreende medidas não farmacológicas, com aconselhamento acerca das mudanças dos aspetos práticos da vida da criança e, em alguns casos, medidas farmacológicas, com medicamentos que reduzem a quantidade de urina durante a noite e/ou medicamentos que regulam o funcionamento do esfíncter vesical. Pode também recorrer-se à utilização de dispositivos tipo alarme, que deteta a urina durante a noite, e promovem o desenvolvimento de mecanismos que levam a criança a acordar.
Embora a enurese noturna monossintomática seja uma situação benigna e tenda a passar naturalmente com a idade, é necessário estar alerta, diagnosticar problemas subjacentes e oferecer orientações e tratamentos que ajudem a criança a ultrapassar esta perturbação.
Pediatra no Hospital Terra Quente